segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Minha Dolores, Mayume chegou cheia de sofreguidão. Lembro bem. Sentou-se devagar numa mesa ao lado da nossa, abriu um livro e, enquanto lia, usando óculos de grau com lentes escuras, não conseguia esconder o choro compulsivo. Apesar de ser uma japa, ou nissei, sansei, não sei. Digo "apesar de" porque as japonesas sofrem mais caladas do que as felinas quando escorraçadas dos muros cheios de arames farpados por machos mau humorados ou feridos. Fisicamente. Visto que, os animais irracionais não sofrem de crises existenciais.

Em determinado momento você se levantou para ir lá dentro (atender ao celular) e, sem mais nem porque, Mayume olhou para mim e disse "desculpe-me". Eu perguntei de que e ela começou a falar. Você voltou, sentou e ela continuou a falar sobre buracos na alma, vazios, medos, faltas de perspectivas...foi quando notei que uma lágrima escorreu no canto esquerdo do seu rosto, Dolores. E para esconder você abriu a bolsa e pegou seus óculos escuros. Mayume prosseguia. Voz baixa, tom mais para agudo do que para grave. Falava de injustiças que nós, pessoas físicas, sofremos quase que diariamente e que de repente, sem mais nem porque, somos levamos por uma onda de exaustão que não se vê em mar nenhum. Nem no mar do Japão. Foi a minha vez de sentir lágrimas nos olhos e sorver cada segundo do silêncio que nos tomou. Os três. Não sei explicar e, sinceramente, não quero nem entender que sinergia maluca foi aquela. Eu, uma asiática (que como toda asiática não sabemos se ri ou chora) e você, dissimulada, numa estranha mesa de um estranho bar de uma mais estranha cidade ainda, compartilhando crises.

Não abri minha mochila para pegar meus óculos escuros porque não sinto vergonha de minhas gargalhadas e muito menos de meu suplício. Mas é fato, e não boato, que os três estávamos mesmo sorvendo uma crise existencial. Sim, eu sei, como numa granja. Cada um no seu poleiro, cada um pensando nas suas coisas, mas os três derramando lágrimas discretas na calçada da Poison, conhecida na região como calçada da má fama. A partir daí concordo com você que de companheira de convés lacrimoso, Mayume alçou a condição de jogadora. Eu, fragilizado, quase caí, mas você, arisca, percebeu e desfez o sushi antes que do caos se fizesse o cosmos. Mesmo que, por 15 minutos, aquela japa-nissei-sansei-não sei marcou, com batom, sua importância em nossas vidas. Mesmo tocando naquela rádio de flash back "Não precisa chorar/é seu somente seu meu coração", nós dois abrimos nossas represas. Mayume? Não sei. Não sei se suas lágrimas eram movidas a verdade ou não passavam apenas de combustível de sedução.

Fico feliz em saber que sua prima passa bem. O que ela teve afinal? Vocês foram juntas para aí? E, espero, vão voltar juntas também. Como ela sempre foi apaixonada por você achei que tivesse ocorrido alguns stress agudo, por razões que não me cabem especular já que, como você sabe, em briga de mulher não sou louco de meter a colher. Preservação, baby. Preservação. Aqui está o maior mormaço. Nas ruas, nos morros, no meu peito. Saudade de você. Daqui a pouco pego o aeroplano, mas volto amanhã à tarde. Mania. Por que essa mania de ficar lhe dando satisfações? Sei lá, linda. Sei lá. Beijos do Tony.

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