segunda-feira, 2 de novembro de 2009

(...) Basta, Tony! Basta...
Amo-te, não posso negar. Mas recuso com todas as forças que você me faça prisioneira de sua mente desgovernada, de seus afetos doentios. Às vezes, olho-te enquanto dormes. Ou - não, espere - só escuto o ressonar profundo que vem de você, que vem do quarto, enquanto leio, na sala, o texto derradeiro de nossa própria história. Não compreendo os ditos dessa linguagem, as entrelinhas de seu silêncio masculino e cruel. Cruel! Cruel, sim!

Você me usa o tempo todo. E de forma tão gentil. Acredito na sinceridade cretina dos seus gestos, dos seus destemperos. Você não mente. Ah, lá isso, não! Mentiroso você não é. Nunca foi. Mas sua verdade é também sua grande armadilha. O mel que me atrai para um caminho cada vez mais escuro e tortuoso. Meu corpo lanhado de sangue. Cada vez mais estreito em direção a ti.

"Bem-vinda a mim", você diz. Com a cara lavada de uísque e um sorriso cínico de quem se sabe amado. "Deixa. Deixa ela chorar à vontade. Só eu posso consolá-la. Só EU tenho o que ela quer", declara vitorioso aos amigos de copo e gim.

Em prantos, aguardo de joelhos você voltar. Acendo velas, rezo o terço e imploro a Nossa Senhora em oração que faça de você o meu José. O meu doce e crédulo José. Fugindo comigo para lugares inóspitos e malditos. Assumindo filhos que não são seus. "Dá-me filhos, senão morrerei!"

Tony, Tony, Tony. Lembro da primeira vez que o vi e me enamorei. Não era cínico o seu sorriso. Você me olhou e, entre um sussurro no pescoço de uma sirigaita e outra, me senti a mais desejada das mulheres. A mais amada, a escolhida. Num mar de coxas e seios fartos. E eu. Eu era apenas eu. Diante da promessa de um amor andarilho e repleto de possibilidades que eu jamais um dia ousara ter.

Com amor,
Dolores Vidor

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