segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Dolores,

Amor é como balão de São João. Cai, cai sim, mas de bucha acesa. Por isso você diz que me ama. Lembra que quando assumi a gerência da loja de lingeries você me deu um longo beijo quando cheguei em casa? E... posso falar, Dolores? Você me chamou de vitorioso (ou teria sido virtuoso?). E ergueu a taça. Brindamos à minha gerência. Bebemos. Lembra? Bebemos e você confessou seu amor por minha mente desgovernada e meus afetos doentios.

Nunca entendi. Nunca! Eu me sentia até carola diante dessa humanidade torpe que ronrona sob as marquises como ratazanas no cio. Mais: eu não me sentia homem suficiente para você. Por isso, calei. Calei porque lá no íntimo, enquanto me masturbava no quarto, sabia que na sala você lia o grand finale de nossa história, pernas entreabertas, clitóris saciado por minha língua horas antes. Só me restava fingir que nada estava acontecendo. O orgasmo vinha, inundava parte de nossa cama e eu dormia como uma pedra...rolante.

Não te usei naquelas 37 noites de experiências múltiplas que vivemos em Quito. Gentilmente a convidei para brincar de Henry and June com nossas duas concubinas. Você concordou. Uma noite. Duas noites. Doze noites. Vinte e três noites. Trinta e sete noites. Quito, Equador. Esqueceu? Esqueceu que tive que te arrastar pelos cabelos para que não viessem mais 37 noites, sempre ao som de Are You Experienced?, de Hendrix? Você me manipula como esses mamíferos que ficam nos sinais achacando os otários em troca de malabarismos de quinta. Mas eu gosto de me sentir vítima enquanto lambo os consentidos filetes de sangue do teu corpo.

Meus amigos de copo e gim? Sempre menti para eles. Como o copo e o gim. Jamais a profanei te atirando numa roda de conversas, como se fosse uma ficha vagabunda de um pano verde em Las Vegas. Quando iremos a Las Vegas? Você prometeu. Enquanto me pró-metia naquele 11 de setembro de 2001. Lembra? Os amigos de copo e gim não sabem da sua existência. Menti para eles. Inventei uma outra mulher, dessas que estendem tapetes vermelhos à minha suposta onipotência. Não, Dolores. Eu não posso consolá-la. Você não quer ser consolada. Optou pela vitimologia e...e...e...Are You Experienced? Dolores?

Quando estou na loja de lingeries penso em você. Nos filhos que prometeu, mas não me deu. Por que? Não sei. Saberei? Não sei se saberei? O que você quer de mim? O José ou o orvalho na sua cona? Lembro dos tapas que eventualmente você me dá, olhos marejados, boca fechada. Nunca você disse uma só palavra sobre os tapas que me deu. Nunca! A nossa história parece o som do silêncio, e até o dia que a conheci, me fazendo de bêbado, fingi acreditar quando você disse que estava ali pela primeira vez. Até hoje não sei se você disse ou diçe. Eu a levei aos abismos mais confusos, mas sempre a trouxe de volta. O nome disso é amor. Mas, que pena, eu nunca disse. Eu nunca disse que você é a mulher das minhas vidas. Deixei o assunto para os nossos epílogos resolverem, porque apesar do nada que se faz tudo, eu te amo.

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